sexta-feira, 23 de outubro de 2009

"Mudança de sexo: Cirurgia em debate na web"

"A Sala de Convidados, do Canal Saúde / Fiocruz, amplia o debate sobre a cirurgia de transgenitalização pelo Sistema Único de Saúde (SUS), sexta-feira (23), às 13h. Muito mais que mudança de sexo, o procedimento envolve quebras de paradigmas para o paciente e para a sociedade. Um exemplo é o direito de alterar a certidão de nascimento.

A equipe de reportagem do Canal Saúde foi ao Hospital Universitário Pedro Ernesto, no Rio de Janeiro, para acompanhar como está o atendimento. Lá, são realizadas duas cirurgias por mês.

Interativo – No programa Sala de Convidados, o público participa ao vivo pela WEB www.canalsaude.fiocruz.br, no chat, ou assistindo pela NBR e ligando 0800 701 8122. Se preferir, antecipe a participação pelo canal@fiocruz.br

Convidados – para discutir o tema com telespectadores e internautas estarão no estúdio a coordenadora da área de Saúde da Mulher, do Ministério da Saúde, Lena Peres; a pesquisadora do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Márcia Arán; e a consultora em Direitos Humanos da Aracê – Mobilização Social em Direitos Humanos, Feminismos e Transexualidade. O programa vai contar com a presença de um cirurgião para esclarecer dúvidas a respeito dos procedimentos médicos. A cirurgia de transgenitalização é de alta complexidade, chegando a durar até sete horas.

Identidade – Na semana passada (15/10), a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu por unanimidade que o transexual tem o direito, se assim pretender, de alterar sua certidão de nascimento, com relação a nome e gênero, após ter realizado, no Brasil, a cirurgia de transgenitalização.
O STJ acatou o recurso de um transexual chamado Clauderson – que pretendia adotar o nome de Patrícia – contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo pela qual no registro civil “prevaleceria a regra geral da imutabilidade dos dados, nome, prenome, sexo, filiação etc”. O TJ-SP sustentava que a afirmação dos sexos (feminino ou masculino) não obedece a aparência, mas a realidade espelhada no nascimento, que não poderia ser alterada artificialmente. A defesa do transexual, por sua vez, alegava que a aparência de mulher, por contrastar com o nome e o registro de homem, causava-lhe diversos constrangimentos sociais, além de abalos emocionais e existenciais.
No julgamento, prevaleceu o voto da relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, para quem não faz sentido o Brasil permitir cirurgia no Sistema Único de Saúde (SUS) e não liberar a modificação no registro civil. Para a ministra, “há um conjunto de fatores sociais e psicológicos que devem ser considerados” para que o indivíduo que passou pela cirurgia tenha uma vida digna. A ministra lembrou ainda que a troca do registro já é prática permitida em diversos países (Agência Brasil).

Onde ver – Para saber como assistir a NBR na sua cidade ou obter mais informações sobre a NBR, acesse http://www.ebcservicos.ebc.com.br/veiculos/nbr Para assistir no site do Canal Saúde, acesse, clique na TV com a inscrição “ao vivo” e participe a partir do chat associado à transmissão. Se preferir, antecipe suas perguntas: canal@fiocruz.br. A Sala de Convidados é apresentado por Renato Farias."


Publicado em: 21 outubro, 2009 por Reportagem


fonte: http://www.redenoticia.com.br/noticia/?p=14747

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

"Cadê nosso Stonewall?" por João Silvério Trevisan

"Em 1973, deixei o Brasil e fui morar nos Estados Unidos, mais precisamente em Berkeley, cidade ao lado de San Francisco, na California. Aí vivi metade dos 3 anos que passei em exílio provocado pela ditadura militar. Berkeley era então um verdadeiro caldeirão de experiências da contra-cultura, com um intenso debate político sobre direitos civis, inclusive femininos e homossexuais. Eu, ex-seminarista com veleidades anarquistas, curtidor de rock´n roll e homossexual recém-saído do armário, viajei para lá desejoso de viver o meu tempo e conhecer novas alternativas. Enquanto trabalhava em restaurante para sobreviver, eu me descobri fazendo parte de uma luta e de uma comunidade. Enturmei-me com jovens homossexuais, integrei-me em grupos gueis de conscientização (alguns reunidos em salões de igreja), trabalhei em programas de rádio para a comunidade guei, freqüentei grupos de anti-psiquiatria, fiz pique-nique no dia do Orgulho Gay, participei da Gay Parade de San Francisco e mergulhei na intensa vida sexual que se descortinava por toda parte. O mais engraçado era que ninguém se preocupava em integrar-se necessariamente a nenhum grupo ativista. A comunidade discutia política homossexual como se a respirasse no ar. E todos participávamos da luta liberacionista pelo simples fato de sermos homossexuais.

Nada disso caiu do céu. Em 1969, um episódio violento deflagrou o moderno movimento homossexual. Ocorreu nas ruas, protagonizado por homossexuais anônimos, legítimos representantes da comunidade guei. Em Nova York, na madrugada de 28 de junho desse ano, uma sexta feira, ocorria uma batida policial rotineira num bar dançante, o Stonewall Inn, em Grenwich Village. O local, freqüentado sobretudo por homossexuais jovens, não brancos e travestis, tinha fama de ligação com a máfia, funcionava sem alvará para bebidas alcoólicas e apresentava shows de go-go boys semi nus. Era, portanto, um prato cheio para o novo delegado que acabara de tomar posse no Distrito Policial do bairro e precisava mostrar serviço. Conforme relato do jornal Village Voice de 3 de julho de 1969, a pequena multidão de clientes retirados à força do bar começou a gritar e vaiar, diante da prisão de algumas pessoas. A chispa incendiária ocorreu quando, ao ser levada por um policial, uma lésbica reagiu e começou a incitar à briga. A resposta foi imediata. Da multidão, mas também das janelas vizinhas, começaram a chover moedas, latas de cerveja e garrafas sobre os policiais. Mais homossexuais foram aparecendo e passaram a atirar-lhes pedras do calçamento. Um grupo trouxe um parquímetro retirado da calçada, com o qual golpeou as portas trancadas do bar, como um ariete. Alguém gritou pedindo gasolina e, de repente, o bar estava em chamas. Mais policiais chegaram, para resgatar seus colegas acuados pela multidão. À frente do ataque aos policiais, não estavam representantes da classe média local, mas travestis porto-riquenhos e jovens bichas desmunhecadas - gente que não tinha nada a perder. A revolta se espalhou pela vizinhança, por toda a madrugada e a noite seguinte, com homossexuais enfurecidos jogando latas de lixo contra carros da polícia e enfrentando um esquadrão da polícia anti-motim, aos gritos de "Gay Power". No sábado, os muros da região estavam cheios de pichações conclamando ao gay power. No domingo, o poeta Allen Ginsberg apareceu no local para dar seu apoio e comentou com a reportagem: "Os gueis perderam aquele olhar ferido que tinham dez anos atrás." Logo depois, nascia em Nova York o Gay Liberation Front, um grupo de homossexuais militantes que pregava a revolução guei. Ramificações dessa organização espalharam por todo o país a luta pelos direitos homossexuais, inclusive em estados mais conservadores e cidades menores. Saídas do meio da comunidade e não de partidos políticos, as novas lideranças homossexuais foram elaborando um programa político novo e passaram a usar um discurso próprio, a partir dos direitos homossexuais. Inaugurava-se aquilo que passou a se chamar gay mouvement.

Bem diverso foi o processo no Brasil. Aqui, o movimento homossexual nasceu e continuou sendo, com raras exceções, uma atividade de classe média. Além de não termos leis expressamente contrárias à prática homossexual, o ativismo guei sofreu grande atraso por causa do "jeitinho" brasileiro: ao invés de enfrentar a situação, aqui é mais fácil manter uma vida homossexual disfarçada detrás de um casamento hétero. Nos Estados Unidos, a barra sempre foi muito mais pesada para homossexuais: ainda existem vários estados onde a sodomia é ilegal, mesmo que praticada em privado. Portanto, lá a luta contra a discriminação tornou-se muito mais radical e mobilizadora, independentemente das classes. Outro fator é o diferente tipo de esquerda que havia no Brasil e nos Estados Unidos, no seio das quais nasceu o movimento guei. Na época da batalha de Stonewall, boa parte das nascentes lideranças homossexuais americanas compartilhava da contra-cultura, com vivência nas lutas pelos direitos civis, que não se restringia às classes médias. Considere-se também que, no caso americano, não se tratava de uma esquerda hegemônica, organizada em torno de um projeto partidário centralizador. Os partidos socialistas americanos nunca foram tão fortes quanto na América Latina. Lá o espectro ideológico da nova esquerda (new left) integrava-se ao espírito da chamada contra-cultura, na qual vicejavam diferentes tipos de socialistas e marxistas, hippies, anarquistas, pacifistas, ativistas negros, militantes feministas e ambientalistas. Estruturada em torno dos direitos civis e da luta contra a guerra no Vietnã, a nova esquerda americana deixou que as lideranças homossexuais bebessem em sua fonte, mas também teve flexibilidade para lhes permitir uma identidade própria. Assim, quando o moderno movimento homossexual começou nos Estados Unidos, já estava em curso uma severa crítica das feministas à esquerda machista. Foi delas que o ativismo homossexual americano emprestou vários conceitos ligados a questões de gênero e não apenas de classes. Portanto, pode-se dizer que o movimento de liberação homossexual americano é filho da contra-cultura e logo passou a dialogar com ela. No Brasil, ao contrário, era mais difícil o convívio com as divergências, nas alas progressistas. Ainda que contrárias ideologicamente aos partidos da elite burguesa, nossa esquerda manteve sempre a mesma postura autoritária da política tradicional do país. Organizou-se em partidos centralizadores e teve dificuldade para se antenar com temas mais modernos. Como sempre visou posições hegemônicas, opôs-se ferrenhamente à autonomia do movimento negro, de mulheres e de homossexuais. Lembro do meu assombro no II Congresso da Mulher Paulista, em 1980, quando militantes do MR-8, grupo dissidente do partido comunista, invadiram o TUCA-SP, onde se realizava o encontro, e deram porradas nas feministas, sob pretexto de que elas estavam provocando a fragmentação da luta proletária. No mais das vezes, tratava-se de partidos homofóbicos. Quando nós do grupo SOMOS-SP nos organizamos como primeiro grupo de liberação homossexual do Brasil, em 1978, ficamos diante de um paradoxo: aprender quase tudo com as esquerdas que nos rechaçavam e buscar um discurso próprio, que propiciasse inclusive críticas ao machismo esquerdista.

A organização centralizadora da esquerda passou para os grupos de liberação homossexual, que sempre se engalfinharam em disputas pelo poder. Assim ocorreu com o grupo SOMOS-SP, tomado pela Convergência Socialista, através de um golpe em 1981. Isso jogou no lixo o esforço pela autonomia, pois boa parte das lideranças homossexuais passaram a se curvar às prioridades do recém-nascido PT, o único partido que apoiava a luta pelos direitos homossexuais. O movimento guei de São Paulo, então o mais estruturado do país, debilitou-se até quase desaparecer, na década de 1980. Quando a epidemia da Aids irrompeu, por volta de 1983, tentei organizar uma frente contra a doença, e fui procurar os remanescentes do SOMOS, emblematicamente instalado nas dependências do diretório do PT, no Bixiga. A resposta que ouvi do seu líder me deixou assustado pelo sectarismo infantil: o grupo não ia gastar energia com "doença de bicha burguesa que tinha dinheiro para viajar a Nova York". Anos depois, infelizmente ele morreu dessa mesma "doença burguesa". Quanto ao SOMOS, transformado em apêndice da esquerda partidária, descaracterizou-se e sumiu do mapa. Daí por diante, a militância guei tornou-se refém das prioridades do PT.

O resultado é que até hoje o ativismo homossexual no Brasil tateia em busca de um discurso político próprio. Ao contrário, os projetos e as abordagens do movimento homossexual brasileiro continuam, no geral, tributários da esquerda heterossexual. Graças a essa cooptação, boa parte das lideranças gueis fala um jargão restrito à classe média politizada, o que dificulta sua interação com a comunidade homossexual e se traduz em reduzidíssima capacidade de mobilização. As exceções são as Paradas do Orgulho Gay, que infelizmente se reduzem a um dia por ano. Mas, enquanto nos Estados Unidos há inúmeros políticos abertamente homossexuais eleitos em todo o país, o Brasil não consegue emplacar representantes gueis nem para o legislativo. Abandonada a si mesma, a comunidade homossexual brasileira perpetua uma grave inconsciência política, e não consegue se juntar para lutar por seus direitos. Cria-se um círculo vicioso, no qual as lideranças não se comunicam com a coletividade que, por sua vez, não participa do processo, gerando lideranças fragilizadas por excesso de trabalho, vaidade e disputa de poder. Como conseqüência, a comunidade homossexual brasileira continua sujeita a líderes oportunistas, que se apropriam da voz da coletividade, para manipular e se auto-promover. Enquanto isso, a liberação guei parece ter conseguido apenas o direito de consumir - sexo, drogas e roupas da moda. Triste fim para algo que um dia pretendeu transformar a sociedade."

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Stop Patologização Trans 2012


Lisboa: 17 de Outubro, 15H, Largo de Camões - Lançamento público.

Luta pelos direitos de transexuais, transgéneros e intersexuais:

- Exigimos a retirada da transexualidade dos manuais de doenças mentais (DSM-TR-IV e CID-10) .

- Fim da transfóbica classificação da transexualidade como doença mental pelos sistemas de saúde.

- Repensar urgente do programa de “tratamento da transexualidade”: fim da OBRIGATORIEDADE de acompanhamento psicoterapêutico e avaliação psiquiátrica.

- Acesso à assistência médica e tratamento hormonal e cirúrgico pelos serviços públicos de saúde às pessoas trans que o procurem.

- Inclusão da “identidade de género” no artigo 13º da Constituição da República.

- Lei da Identidade de Género.

- Direito a alterar o nosso nome e sexo em todos os documentos oficiais sem ter que passar por nenhuma avaliação médica, nem psicológica, ou por tratamento obrigatório ou diagnóstico.

- Concessão imediata de asilo político às pessoas trans imigradas que chegam ao nosso país fugindo de situações de violência extrema.

- Direito à mudança de nome e sexo nos documentos de identificação sem tratamento obrigatório ou diagnóstico, ou qualquer avaliação médica ou judicial.

- Fim do parecer obrigatório da Ordem dos Médicos sobre os processos de transexuais.

- Fim das operações a recém-nascidxs intersexo.

- Fim da esterilização obrigatória de transexuais masculinos.

- Combate às dificuldades e discriminação no acesso ao mercado laboral pelas pessoas transexuais e transgéneros.

- Condições dignas de saúde e segurança para trabalhadorxs sexuais e o fim do assédio policial a que estão sujeitxs, bem como do tráfico sexual.

- Educação e protecção contra a Transfobia.

MOBILIZAÇÃO SIMULTÂNEA EM 30 CIDADES: Ankara (Turquia), Barcelona (Estado Espanhol), Berlim (Alemanha), Bilbao (Estado Espanhol), Bogotá (Colómbia), Bruxelas (Bélgica), Buenos Aires (Argentina), Campinas (Brasil), Caracas (Venezuela), Ciudad de Mexico (México), Corunha (Estado Espanhol), Donosti (Estado Espanhol), Gasteiz (País Basco), Granada (Estado Espanhol), Las Palmas (Estado Espanhol), Lille (França), Lisboa (Portugal), Londres (Reino Unido), Madrid (Estado Espanhol), Montreal (Canadá), Paris (França), Quito (Equador), São Francisco (EUA), Santiago de Cali (Colômbia), Santiago do Chile (Chile), Santiago de Compostela (Estado Espanhol), Valência (Estado Espanhol), Zaragoza (Estado Espanhol).

fonte: http://port.pravda.ru/news/mundo/13-10-2009/28140-stoppattrans-0

sábado, 10 de outubro de 2009

Judith Butler e os "problemas de gênero"
















Intersexos: Estar à margem do binarismo sexual é "habitar a terra de ninguém"

Nenhum ser humano é exclusivamente feminino ou masculino mas, socialmente, estar à margem do binarismo sexual homem-mulher é como "habitar a terra de ninguém", afirma Ana Sofia Neves, investigadora no Instituto Superior da Maia.

Em declarações à agência Lusa sobre a condição da atleta sul-africana Caster Semenya, que será pseudo-hermafrodita, Sofia Neves, doutorada em Psicologia Social, sublinhou que ninguém "é estritamente homem ou estritamente mulher, mesmo que as nossas características bio-genéticas pareçam querer atestar essa ideia do sexo puro".

Numa linha de pensamento existencialista, o conceito de "sexo" refere-se a "um conjunto de atributos bio-genéticos que diferencia os machos das fêmeas" mas existe outra noção importante neste quadro, a de "género", que diz respeito a "um leque alargado de representações, expectativas e papéis sociais associado a cada um dos sexos biológicos", explicou.

Para a especialista, o sexo é, nesta óptica, "o produto da natureza" e o género "o produto da cultura" - dois aspectos que podem também ser vistos como "categorias sociais e discursivas" constitutivas do corpo e da identidade.

Nesse caso, "a ideia de sexo natural passa a ser, em si mesma, uma ideia contestada, já que a instauração da diferença sexual binária [homem/mulher] é apenas uma forma de categorização social, de entre outras possíveis", salientou à Lusa, acrescentando que a categorização poderia ser feita com base noutros referenciais que não os órgãos sexuais.

Na sequência destas noções, a docente e investigadora na área das questões de género considera que a referência a "dois ou quatro, ou sete, ou onze sexos é redutora" pois "a tipologia das categorias sexuais é ilimitada".

Focando-se no caso concreto de Caster Semenya, cuja condição sexual começou ser investigada na sequência dos resultados obtidos nos mundiais de atletismo de Berlim, Sofia Neves lamentou a forma como o assunto tem sido abordado.

"O que começou por estar em evidência foi o facto de uma jovem atleta, alegadamente atípica na aparência e nos comportamentos (não feminina portanto), obter, nas provas em que participa, resultados igualmente atípicos para uma 'simples' mulher", assinalou.

E a primeira questão foi tentar perceber "se se tratava de um homem a fazer-se passar por uma mulher (já que dificilmente uma mulher 'comum' seria capaz de tais feitos desportivos) ou se, por outro lado, se tratava de uma 'super-mulher' (uma mulher de excepção que, por razões desconhecidas mas provavelmente estranhas, se evidencia das outras mulheres)", reforçou.

Para Sofia Neves, que está a organizar um seminário sobre Género e Ciências Sociais, previsto para 4 e 5 de Dezembro, até agora os testes efectuados a Caster Semenya vão apenas no sentido de "apurar a 'verdadeira condição sexual' da jovem a partir de meros indicadores bio-genéticos".
"Não me parece que, em algum momento, o assunto tivesse sido tratado à luz das questões da identidade desta jovem, tal qual ela a percepciona", lamenta.

Assim, "ter uma dupla condição sexual ou ter uma 'anomalia sexual' (como habitualmente o hermafroditismo é designado) serve como um atestado de despersonalização, já que a identidade passa - para quem a avalia de fora - a ser um conceito aparentemente difuso ou improvável", acrescenta.

Ora, "não se sendo unicamente homem e não se sendo unicamente mulher, então questiona-se o lugar de pertença das pessoas", acabando o crivo social por "mostrar a estas pessoas que elas pertencem a um não-lugar, como se estar à margem do binarismo sexual (homem-mulher) significasse habitar a terra de ninguém", conclui.

O sexólogo Francisco Allen Gomes complementa que é necessário tacto na forma como se designam as pessoas num estado de intersexualidade, pois "com muita facilidade se estigmatiza" e "as palavras ferem".

Ex-chefe de serviço de Psiquiatria dos Hospitais da Universidade de Coimbra, onde foi responsável pela consulta de Sexologia até à sua aposentação, em 2001, Allen Gomes questiona a forma como a condição de Caster Semenya está a ser avaliada e considera excessiva a exposição pública da jovem.

"Vão analisar a atleta para saber se é um homem ou uma mulher? Ela pode ser um XY e ter uma identidade feminina, como pode ser um XX, ter havido uma masculinização por qualquer motivo, e ter uma identidade feminina", declarou.

"Imaginemos que essa rapariga - porque é uma rapariga - nunca soube da sua situação… Ver, de repente, a sua identidade posta em causa é uma coisa brutalmente traumática, violentíssima", sublinhou.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

11 de outubro - Dia de "sair do armário"




Ganhamos uma versão brasileira do "National Coming Out Day", o "Dia de sair do armário", campanha promovida pelo "Estruturação", um grupo LGBT de Brasília. Com direito à concurso de fotografias, pretende-se uma oportunidade para refletirmos sobre a importância ético-política de assumir a própria sexualidade. E que se destaque esta palavra: sexualidade.




Diferente do que venho lendo em alguns sites, entendo que o evento deva ser mais do que uma celebração da homossexualidade, mas sim a possibilidade de reflexão sobre a multiplicidade das práticas sexuais que acabam sendo excluídas e inferiorizadas por moralismos, inclusive, dos próprios grupos LGBT, insistentes na moderna referência identitária.